Mais uma vez julgando e absolvendo o art. 2º, II, da Lei 8.137/90, por me negar a servir de cobrador - e ameaçar com pena - quem não pagar.
Segue parte da decisão:
"Se algum cidadão pactua com outro o pagamento de uma parcela de trato sucessivo e deixa de adimplir ao pagamento no dia pactuado resta uma obrigação civil.
Nenhum membro do Ministério Público ou mesmo Magistrado iria duvidar em dizer que isto não é crime. Os exemplos são muitos. A discussão que precisa ser posta é: só pelo exclusivo fato de figurar numa parte da relação o Estado é possível a criminalização da dívida?
A resposta de que está previsto em lei não serve. O legalismo fetichista já foi ultrapassado há muito, embora o posicionamento majoritário em sentido contrário. Se assim fosse, não seria preciso controle de constitucionalidade (concentrado e difuso). Por isto, com o devido respeito a quem pensa diferente, sem que o acusado tenha obrado com dolo, fraude, ardil, o fato de ter declarado que devia e não ter adimplido, não pode ser configurado como crime. Dito diretamente: O Estado não pode criminalizar as dívidas. Mas não é só.
No fundo o Poder Judiciário funciona como um grande escritório de cobrança, arrisco dizer, forçada.
Primeiro o acusado é chamado a pagar o débito e sempre com a – não tenho outra palavra - "ameaça" de ser processado. Depois, ainda, na hipótese de suspensão condicional do processo, deve pagar "sob pena de ser processado".
Enfim, no que se chama democracia, o Estado, via Poder Judiciário, serve de um grande escritório de cobrança do poder público. E não se trata de dizer que estaria liberada a sonegação, pois este argumento é falacioso.
Existem procedimentos próprios e democráticos, vide Lei de Execução Fiscal, com diversos benefícios em favor do Estado. Mas não, se quis mais. Colocou-se a coação da prisão como "forçamento" ao pagamento.
Também não é o caso de se dizer que nas hipóteses do art. 1º da LEI n. 8.137/90 se possa penalizar, pois nestes casos houve ardil, fraude, situação diversa do art. 2º, II, da Lei n. 8.137/90.
(...)
Destaco o posicionamento de Márcia Aguiar Arend (Os Planos de Refinamento Fiscal à Luz da Teoria da Imputação Objetiva Implicam a Não Tipificação do Crime Descrito no Art. 2º, Inc. II da Lei nº 8.137/90. Revista Jurídica do Ministério Público Catarinense / v. 4, n.9, p. 63-64, (maio./ago. 2006), para quem os mecanismos com que o Estado lida com seus inadimplentes – com demasiada tolerância e até estímulo ao não cumprimento das obrigações tributárias -, resultam na própria não tipificação do crime: "Este estado de desordem tributária é mesmo estado de risco assumido.
A vítima estimula a conduta inadimplente ampliando prazos e reduzindo encargos. Logo, não há como compreender-se criminoso o agente inadimplente. A inadimplência tributária vem sendo gravemente chancelada pela administração tributária.
Como então, admitir-se aviltado o bem jurídico ordem tributária se a desordem parece ser mais benevolentemente regrada que a ordem?". Conclui assim que "Se o risco de lesão ao bem jurídico é permitido, então não há crime contra a ordem tributária. E se não há crime contra a ordem tributária em razão da tolerância à agressão a esta mesma ordem, não pode o Direito Penal ser utilizado para reprimir o que o mundo fora dos autos tolera e estimula".
Por: Alexandre Moraes da Rosa
Fonte: facebook
3 comentários:
Simplesmente brilhante o entendimento do Dr. Alexandre Moraes da Rosa.
Não tenho simpatia pela área penal e tampouco a tributária, porém, não poderia deixar de postar uma decisão de tamanho bom senso.
Parabéns !!!
O senhor poderia me informar o númedo dessa decisão para que eu possa ter acesso ao inteiro teor?
Desde já agradeço
Fernanda Andrioli
(fernanda.andrioli@jaloreto.com.br)
Faço o mesmo pedido da Fernanda.
Meu e-mail é fabianaukei@gmail.com
Obrigada,
Fabiana Ukei
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